sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Profiteroles

Houve uma época, em um passado que embora pareça muito, muito remoto, não é tão distante assim, que fui a um encontro com um amigo de uma amiga. Com o passar dos anos, a memória falha, mas alguns detalhes são realmente inesquecíveis. As referências eram muito positivas: bem apessoado, um homem muito culto, apreciador da boa leitura. Na ocasião, o descritivo pareceu suficiente e como gosto não se discute, melhor não ouvir os detalhes e ir ver com os próprios olhos do que se tratava. Saímos para jantar. Cautelosa, preferi ir de carro, porque nunca se sabe quanto rápido pode ser necessária a fuga. Conversamos muito, principalmente sobre literatura, alguns pouquíssimos e irrelevantes gostos em comum, pelo que me lembro. A certa altura, o moço soltou a pérola... ele lia todos os dias 10 páginas. Não havia exceção nem consideração se o livro era bom ou ruim. Eram 10 páginas por dia, estoicamente. Isto dava a ele, segundo o próprio, uma grande segurança, pois ele sabia, assim que pegava o livro nas mãos, quantos dias demoraria para lê-lo. Com minha transparência habitual, e formação na área de psicologia, não pude disfarçar meu choque diante de tamanha obsessão (para ser fina e não escancarar: aberração). Quando achamos que estamos no fundo do poço, vem o tatu e cava mais um pouco, e o sujeito conseguiu piorar a situação. Pediu de sobremesa uma porção de profiteroles. Perguntou ao garçon quantos profiteroles vinham na porção. O garçon respondeu que 5. Ele começou um discurso para convencer o garçon que ele precisava de 6 profiteroles, pois estávamos em dois e precisávamos dividir. Eu logo disse que 2 profiteroles eram suficientes para mim (frase inédita e única na minha vida), mas não houve jeito, o moço não se deu por vencido enquanto não conseguiu negociar mais um profiterole. E então, veio o gran finale... ao terminar a porção, ele chamou o garçon e tentou conseguir mais um chorinho de profiterole! Para mim, o inglório jantar não poderia se prolongar nem por mais um segundo...e soltei: "não posso mais ouvir você pechinchando profiteroles! por favor, se você quiser mais, peça mais uma porção, eu pago!" Que alegria ter ido com meu próprio carro!

terça-feira, 22 de maio de 2012

Cobras e lagartos

Tenho fobia de cobras. Não é de hoje, é de sempre. E parece que, ao longo dos anos, tenho ficado cada vez com mais e mais medo destes répteis. As cobras fazem parte dos meus pesadelos mais assustadores, aqueles em que acordo com o coração disparado. Meu medo de cobras sempre foi um pouco incompatível com o meu grande amor pela natureza. Apesar de odiá-las, temê-las, sempre fui ao encontro delas. Chapada Diamantina, Chapada dos Veadeiros, Pantanal, Serra da Canastra, do Cipó, Amazônia, Ilha do Caju, Bonito. Os passeios pelas cachoeiras e trilhas, pela linda natureza deste país sempre estiveram permeados por um olhar temeroso, uma procura por aquilo que não se quer achar, e que eventualmente aparecia no caminho. O melhor lugar do mundo é Fernando de Noronha, aquela natureza exorbitante e total ausência de cobras na ilha. O paraíso. O pior lugar do mundo é a Ilha do Cardoso. Foram 2 cobras (uma viva e uma morta) em 2 dias de passeio. No terceiro dia, fiz as malas e fui embora. Não preciso ficar nem um segundo em um lugar destes. Trabalho na Barra Funda. Não é exatamente um lugar conhecido pela exuberância da natureza ao redor. Trata-se de um prédio, parte de um condomínio de 4, cada um com 20 andares. No térreo tem um jardinzinho sem graça. No escritório tem alguns vasos de plantas. Todos os vasos foram trocados há alguns dias. Na minha sala tem uma espécie de mini palmeira. O jardineiro vem toda semana fazer a manutenção. Ontem eu estava na sala e quando me virei, tinha em cima da minha mesa um bicho. Um híbrido de barata com grilo. Se eu estivesse em uma pequena pousada em Alter do Chão, talvez esperasse por isto. A surpresa foi enorme, convertida em um pulo. Chamei alguém para me socorrer e tirar o bicho. Na sequência veio a moça da limpeza e eis que ela me contou que no dia anterior, de uma das plantas novas saiu um filhote de cobra! Filhote de cobra! Em plena Barra Funda! 15 cm de terror, segundo o relato dela! E ela ainda quis me mostrar a foto que ela e os bombeiros tiraram do bicho e que é claro que eu não quis ver! Fiquei estarrecida! Passei o dia apavorada, mesmo depois de saber que os bombeiros examinaram tudo, que a empresa de plantas novas desmontou os vasos. Não há lógica para lidar com o medo, com o pavor. Não posso ver cobra nem na televisão. Outro dia, tomei o maior susto folheando uma revista com uma foto de cobra. E a perspectiva de ter uma cobra no meu ambiente de trabalho estragou o meu dia. Não compartilhei com ninguém do trabalho. Não quero estragar o dia, o sossego de mais ninguém. Vou viver o terror sozinha. A única vantagem de morar em uma cidade cinza, poluída e feia era a certeza de não deparar com cobras no caminho! Certeza que foi pelo ralo. Estou pensando em comprar um gavião para andar a tiracolo.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Prudência e dinheiro no bolso

Um amigo estrangeiro, visitando o Brasil decidiu ir para Prudentópolis. Nem sabia que esta cidade existia, no estado do Paraná.
Pergunto: Prudência é uma virtude ou uma característica dos chatos?
A cidade da prudência deve ser um lugar muito entediante.
Por um lado, os moradores de Prudentópolis certamente não se envolvem em acidentes de trânsito, tampouco acidentes domésticos. Ninguém joga uma bituca de cigarro na rua, não dão uma olhadela para a mulher do próximo, não arriscam um centavo sequer na bolsa.

Imagino que neste lugar os moradores escolham tão bem as palavras que vão usar que cada conversa acontece com uma cadência lenta e arrastada.
A cidade é tão prudente que meu amigo deixou de ir após receber a informação que as cachoeiras (suposto atrativo do lugar) estavam secas em plena época de chuva.

Se prudência e dinheiro no bolso não fazem mal para ninguém, este pode ser um futuro lugar para eu ir tomar uma canja de galinha.